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Você é considerado um super-rico pelo governo?
A nova proposta de revisão do Imposto de Renda da Pessoa Física reacendeu um velho debate: afinal, quem é considerado rico no Brasil?
A nova proposta de revisão do Imposto de Renda da Pessoa Física reacendeu um velho debate: afinal, quem é considerado "rico" no Brasil? Pelos critérios do governo, quem ganha até R$5 mil por mês passaria a ser isento do IR, enquanto a faixa intermediária, entre R$5 mil e R$50 mil, teria redução de carga tributária, uma tentativa de aliviar o peso sobre a classe média. Já os contribuintes com rendimentos acima de R$50 mil mensais seriam enquadrados entre os chamados "super-ricos", podendo ser tributados com até 10% adicionais.
A proposta se apoia na ideia de "tributar mais quem ganha mais", alinhada à progressividade prevista na Constituição Federal, um dos pilares da justiça fiscal. Mas é preciso olhar além do discurso. O verdadeiro problema do sistema tributário brasileiro não está na falta de progressividade do IR, e sim no peso excessivo dos tributos sobre consumo e folha de pagamento, que atingem desproporcionalmente as classes média e baixa. Enquanto a renda é tributada de forma relativamente progressiva, o consumo continua sendo fortemente regressivo, ou seja, quem ganha menos paga proporcionalmente mais.
Reduzir o IR das faixas mais baixas é socialmente desejável, mas sem medidas compensatórias, o impacto recai diretamente sobre as contas públicas. O Imposto de Renda é uma das principais fontes de arrecadação federal e financia políticas essenciais como saúde, educação e previdência.
Sem uma reforma mais ampla, que reorganize tributos sobre consumo, patrimônio e renda, qualquer alívio pontual pode gerar rombos fiscais e abrir espaço para novas contribuições, como o recente "imposto verde".
Classificar como "super-rico" quem recebe R$50 mil mensais também ignora o contexto tributário brasileiro. Quando somamos a carga indireta — ICMS, PIS, Cofins embutidos em bens e serviços — a tributação efetiva sobre a renda de um profissional bem-sucedido pode ultrapassar 40%. O debate, portanto, não deveria se concentrar apenas em quanto cobrar de quem ganha mais, mas em como equilibrar o sistema para tributar consumo, renda e patrimônio de forma coerente e sustentável.
O Brasil precisa evoluir para um modelo em que o contribuinte saiba exatamente o que está financiando e perceba o retorno social do que paga. A Reforma Tributária em andamento já avança ao unificar impostos sobre consumo, mas a tributação da renda e do patrimônio ainda exigirá um novo ciclo de ajustes, com foco em simplificação, transparência e responsabilidade fiscal.
Ser considerado "super-rico" pelo governo pode depender mais de uma régua fiscal desatualizada do que da realidade econômica do contribuinte.
Qualquer revisão do Imposto de Renda precisa vir acompanhada de equilíbrio e clareza, para que não se trate apenas de transferir o ônus entre grupos, mas de resolver o verdadeiro desequilíbrio estrutural do sistema.
*Dra. Nayhara Cardoso é Sócia-Diretora e Head Tributário na RGL Advogados